silêncio
Nos últimos tempos tenho sentido que tudo acontece ao contrário, que a ansiedade surge de um espaço exterior que não controlo e que ganha proporções gigantes dentro de mim. Que tudo o que acontece no mundo, com as pessoas que me rodeiam influencia diretamente aquilo que penso sobre mim, sobre as decisões que me trouxeram ao lugar onde estou e que me fazem questionar se tudo isto que construí faz sentido. E por isso este tem sido o ano mais desafiante de todos desde que me lembro de existir, não porque não passei por dificuldades e desafios anteriormente mas porque neste momento sinto que estou a lutar contra a minha própria mente, que esta dualidade entre o achar que estou no lugar certo a fazer a coisa errada me deixa ansiosa, triste, definitivamente com um síndrome do impostor do tamanho do mundo e que isso afetou também aquele espaço seguro que achei que nunca iria tocar.
As lágrimas muitas vezes são apenas de incerteza, da dúvida do porquê de estarem a querer gritar e o aperto na garganta onde parece que existem milhões de coisas que quero dizer e não consigo, mesmo não sabendo sobre o que são e os pensamentos são do mais aleatório possível entre o “está tudo bem, hoje estou calma” e o “não quero isto, não faz sentido, deveria dedicar-me a outra coisa qualquer”. E é aqui, nesta incerteza de uma vida profissional e pessoal que têm uma linha tão ténue entre si que a capacidade de reinventar, de reordenar e de querer um lugar de silêncio onde possa simplesmente deixar tudo fluir, todos os pensamentos conversarem e chegarem a uma conclusão sem impor tempo, espaço ou limites que decidi desligar e pela primeira vez dar um passo atrás e observar, respeitar e abraçar cada uma das dúvidas que surgem de dia para dia.
Se tenho conclusões? Não! Julgo que nunca vão surgir, mas tenho a certeza de que estou a aprender a respeitar-me e a aprender ainda mais sobre este lugar de quietude onde consigo não julgar e onde estou a aprender a viver de dentro para fora.
Ao longo deste ano têm sido várias as mensagens de partilha sobre incertezas, sentimentos de tristeza, frustração e ansiedade que tenho recebido, muitas delas com uma mensagem de agradecimento pela leveza com que partilho as coisas e também isto me faz questionar que imagem passo, quem sou eu para os outros e quem sou eu para mim própria. E neste espaço de silêncio tenho aprendido que sim, de facto sou leve e que me sinto bem quando à minha volta existe uma energia simples e fresca. Porque na verdade, dentro de mim é dessa forma que sinto que a vida acontece, mesmo no meio do caos e na incerteza, eu sei que existe aqui qualquer coisa que me faz sentir com uma certa leveza e com a certeza de que é dessa forma que quero partilhar a minha vida.
Trabalhei com pessoas do marketing que defendem a ideia de que devo partilhar as minhas incertezas e momentos de escuridão apenas quando fizerem parte do passado, porque a vulnerabilidade não é uma coisa que faça vender. E não consigo concordar com isso! Momentos de vulnerabilidade fazem parte do dia-a-dia de todos nós e é a forma como cada um de nós lida com isso que nos torna únicos e que cria conexões, amizades verdadeiras, amores para a vida e a verdade é que sim, em momentos mais negros prefiro sair das luzes das redes sociais, não porque não quero partilhar mas porque não tenho força suficiente para lidar com publicações, stories ou algoritmos. E porque há pessoas que encontram a força para avançar na partilha, no meio da multidão, eu sou reservada, preciso do silêncio, de lamber as feridas sozinha e esperar que cicatrizem totalmente para compreender o que aconteceu.
Ter o suporte incondicional de alguém que me ama e apoia é inexplicavelmente adorável. Poder dizer que preciso de tempo, de silêncio e de criar uma rotina própria para encontrar de novo o foco e ouvir instantaneamente um vai faz-me sentir que a vida que criei no exterior e que o meu lugar seguro não é apenas meu, que esta leveza e simplicidade não se cria sozinha e que realmente o amor importa, a cumplicidade e que o backstage da vida que partilhamos é muito mais importante do que a ideia que transparecemos.
Fiz a mala e vim criar o meu próprio retiro, junto ao mar e por acaso ou não, em semanas de tempestade, completamente fora da minha zona de conforto. Deixei os pensamentos e as dúvidas chorarem vezes e vezes sem conta, escrevi, dediquei-me a um novo projeto, idealizei outros e senti vontade de ficar no silêncio dias inteiros. Conversei comigo, deixei que as várias versões de mim discutissem e abracei cada uma dessas versões, confesso que espero me ter despedido de algumas. Sei que nem todos têm a mesma oportunidade e que não podem simplesmente ir procurar o seu espaço da mesma forma que eu fiz mas também sei que cada um de nós tem um lugar, que cada um de nós tem a capacidade de encontrar esse lugar. Vim sem a certeza de que seria capaz mas com a convicção de que iria dar a oportunidade de compreender se a vida que existe fora de mim se conecta com a vida que existe dentro de mim, porque só assim é possível viver de dentro para fora. Só quando encontramos um ambiente que não seja preciso alterar, um ambiente onde seja possível complementar e sentir que faz sentido pertencer, conseguimos verdadeiramente ter esta conexão inquestionável e ser, simplesmente ser. Compreender se faz sentido mudar e procurar esse lugar noutro espaço. Compreender se a vida dentro de ti está em conflito por ti ou pelos outros. Compreender se te consegues escutar. Compreender que tu és um ser único e que nunca ninguém te vai compreender totalmente, mas que há alguém que aceita e te dá a mão e espaço para encontrares o lugar onde queres deixar florescer o teu interior e enraizar.
Mudar é difícil, tomar decisões é horrível quando podes ter o poder de influenciar a vida de alguém, mas lembra-te que é sobre ti que estás a escrever, que no final tu és a única pessoa que vai ler o livro completo e é a ti que tem de fazer sentido. Qualquer que seja a situação, o momento, a dúvida, a sensação, procura essa distância do espaço que te rodeia para seres, para estares e criares algo unicamente teu.