A minha história
Esta poderia ser a história de alguém a quem o yoga ou a alimentação criou uma mudança radical e salvou a vida, mas não é. Sou apenas eu, e o apenas acredito que seja uma palavra um tanto ou quanto redutora daquilo que foi o meu processo de crescimento até ao dia de hoje… Porquê? Porque assim como tu, também eu sou especial e única. Também eu tenho um percurso de altos e baixos, de conquistas e desesperos e de influência na vida dos outros.
Crescer no meio da natureza, com o cheirinho a comida no forno a lenha, com os pés descalços no campo e a procurar pepitas de ouro no riacho ao lado de casa da Avózinha trouxe-me esta admiração pela natureza, por ver as coisas a crescer e a transformar-se naturalmente. Passar as noites de verão deitada na varanda a olhar a imensidão da escuridão do céu e a admirar todos aqueles pontinhos de luz fez-me milhares de vezes questionar se do outro lado eu também seria um daqueles pontinhos brilhantes no céu de uma criatura ET. E agora compreendo que esta admiração e respeito pela fluidez da natureza é-me natural desde pequenina e que adoro ter a felicidade de trazer isso comigo para a vida adulta! Tenho também consciência de que esses momentos de calmaria na minha mente faziam um contraste gigante com o turbilhão e o furacão de energia que existia dentro de mim. A raiva, a ansiedade e o medo, aquilo a que apelidamos de mau feitio tinham um papel tão grande na definição de quem eu era que talvez agora compreenda que o vazio do céu e das mãos no riacho eram momentos de equilíbrio… Tornar-me na pessoa que sou hoje foi progressivo, aconteceu sem me dar conta de que estava a acontecer
Porque nem todas as mudanças precisam acontecer porque chegámos a um ponto em que precisamos de salvação. Essa mudança pode ser com calma e respeito pelo processo, pode ser apenas porque a vida acontece. E isso é muito bonito.
Da infância e juventude trago também o barulho de gargalhadas, pratos e tachos na cozinha e de festas, muitas festas com a mesa rodeada com família, de dança, jogos e muitos churrascos junto ao rio, no meio da floresta ou simplesmente debaixo do alpendre porque era inverno e mesmo com um frio de rachar, ali estávamos no nosso domingo com a família.
A certeza errada daquilo que queria para o meu futuro fez-me parar um ano para melhoria de notas e a procura por um curso de design na universidade perto de casa mas, nesse ano a minha vida começou a mudar. E se falarmos de propósito de vida, foi naquele lar de deficientes mentais onde trabalhei que descobri o meu! Depois de noites a chorar, de sentir que não pertencia ali, de compreender perfeitamente que era apenas uma estranha para aqueles olhos brilhantes que me viam como apenas mais uma que estava ali para refeições, banhos, medicação, para dizer quando se fazia o quê…
Aos poucos fui compreendendo que precisava respeitar que aquele lugar era a casa daquelas pessoas, que não eram eles que precisavam habituar-se a mim mas sim eu a eles e que a rotina fazia parte da sobrevivência daquela casa. Os arranhões da Júlia tornaram-se abraços, os gritos dos gémeos passaram a ser sorrisos e bom, com o Joaquim a chuva não deixou de ser uma sombra na sua vida, mas o rádio estava sempre afinado com a melhor música popular portuguesa para que houvesse um raio de sol no seu dia mesmo quando lá fora haviam trovões e dentro de casa gritos de medo.
Achei que não seria capaz, acharam que eu não seria capaz mas a verdade é que fui, a verdade é foi depois de estar ali que decidi que queria cuidar dos outros, mas não daquela forma… Queria cuidar de quem cuida, queria orientar equipas, tornar os lugares onde trabalham em muito mais do que isso, queria apoiar o processo de adaptação e a forma como vêm esses lugares. Depois disso é muito o blá blá de uma vida académica sem interesse mas com a certeza de que queria ser diferente do standard que também ali partilhavam… Sim, acho que sempre fui uma rebelde! ahah
Uma das perguntas que mais me fazem é porquê o Porto Santo e para mim a resposta é fácil: a vida trouxe-me e o amor fez-me ficar.
10 anos depois de me mudar para o Porto Santo, é precisamente daquilo que defini aos 18 de que me orgulho – de ter criado um lugar onde cuidadores se sentem em casa, onde por muito estranhos que possam pensar ser, nunca são estranhos sozinhos! A vida no associativismo fez-me crescer, criar o Barco de Papel, coordenar o Velejar pela Inclusão enche-me o coração de orgulho porque durante todo o meu empenho, mudanças bonitas aconteceram com dezenas de famílias! Também foi ali que o yoga me encontrou por acaso depois de um dia extremamente cansativo de verão, também foi ali que as crianças me ensinaram o que é o yoga na vida, o que é viver o yoga fora do tapete. Foram eles que me fizeram acreditar que tudo aquilo que sonhamos é real!
Agora, 7 anos depois de ter começado a praticar yoga, mais de 1000 horas a dar aulas estou novamente decidida a mudar, a trazer conforto para a vida de outras pessoas, a terminar um ciclo e a dedicar-me ao início de outro. E é aqui que nos encontramos, bem-vinda a este novo projeto onde através da simplicidade do yoga te quero ajudar a compreender que isto de viver em harmonia com o teu corpo, que criar um lugar seguro e aconchegante dentro do teu coração é mais fácil se for acompanhada e muito mais deliciosa se acompanhares com momentos felizes à volta da mesa, com ou sem companhia.
O importante é estares contigo, o importante é estares segura de que tu és capaz, de que és única e especial!
Com carinho,
Ana